Esfera azul

Estamos chegando a mais um período quaresmal e, nos próximos dias de penitência e reflexão, entra em cena a Campanha da Fraternidade 2011, com o tema "Fraternidade e a Vida no Planeta" e lema "A Criação geme em dores de parto" (Rm 8, 22). O tema do meio ambiente volta a ser abordado, pois a situação do nosso planeta é crítica. A proposta hoje é refletir um pouco sobre esse assunto através de uma música, topa?

A letra de "Projecto Juno" (Guilherme de Sá), da banda Rosa de Saron, admite algumas interpretações, inserindo no tema da CF 2011 uma delas, que segue:

Rosa de Saron
"Projecto Juno"



Extra!
Vende-se viagens à lua
conheça os buracos da atmosfera
deixem pegadas nas crateras


Mais barato que ir para o Japão
Mais seguro que voar de avião
sem ressalva
sem escalas

Demorei mas fui
da janela vejo a esfera azul


Acho que eu vou saltar
eu não quero ficar aqui
parado sentindo medo
vendo a gravidade me segurar

Acho que eu vou saltar
eu não quero ficar aqui
tentando derreter o gelo
Sinto, mas eu não me adaptei


Alguém me segure, eu vou pular


Extra!
O meu mundo caiu
Volto pro lugar que já foi, mas não é
Que tentou escapar, mas não deu


Que de sobra sobrou o que?
Foi o planeta que despressurizou
e agora respira com máscara demais


E eu já fui
e agora vejo a esfera azul...

Acho que eu vou saltar
eu não quero ficar aqui
parado sentindo medo
vendo a gravidade me segurar


Acho que eu vou saltar
eu não quero ficar aqui
tentando derreter o gelo
Sinto, mas eu não me adaptei...


Tô voltando para a esfera azul...

De uma forma muito sutil, podemos nos colocar no lugar da pessoa retratada na letra. Na real, não "vende-se viagens à Lua", mas muitos de nós viajamos para longe, fechamos os olhos para a destruição no nosso planeta como se tivéssemos para onde ir. A viagem à lua parece um atrativo, uma forma de deixar toda essa destruição que causamos para trás e seguirmos para outro lugar, começar outra história de destruição.

De fato, o Projecto Juno é um estudo da NASA que pretende estudar Júpiter, seus satélites e outras áreas do Sistema Solar. Parece que aqui temos uma alusão à essa busca humana por outro lugar para viver, desenganando a Terra.

No meio da viagem, contudo, vemos a "esfera azul", deixamos para trás este planeta para que ele morra sozinho enquanto buscamos outra casa. E aí, a tirada genial do refrão: "Acho que eu vou saltar / Eu não quero ficar aqui, parado, sentindo o medo / E vendo a gravidade me segurar". Na letra, no caminho da viagem, dá-se conta de que o caminho não é esse. Primeiro porque ninguém garante a tal existência dessa nova "casa", depois porque não é justo vivermos anos e anos destruindo o que Deus nos deu para abandonarmos nosso erro sem assumir suas consequências - todos têm responsabilidade e todos podem fazer alguma coisa. "Volto pro lugar que já foi, mas não é..."

O que sobrou para nós é com o que temos que lutar. Se o que sobrou foi "um planeta que despressurizou", beleza, é com isso que vamos trabalhar para, se não reparar tamanhas destruições, ao menos preservar o que ainda resiste vivo.

"Sinto, mas eu não me adaptei" o que precisamos é isso, é não adaptar-se ao caos que se instaura na Terra. Não dá para achar que esse é o nosso caminho, destruir para consumir. Mas onde iremos consumir? Onde viveremos? Para onde vamos? É hora de voltar dessa viagem, de abrir os olhos, de mover as mãos, é hora de "voltar para a esfera azul".

Valeu!

Davi Ferreira